Valor Econômico: MEC, ilha de excelência entre incertezas

Em: 17 Janeiro 2023 | Fonte: Valor Econômico

É possível se valer da extensa experiência desta equipe para tirar nossas crianças do fundo do poço educacional

Diante do cenário de insegurança econômica, jurídica, institucional e de convulsão social que vem se desenhando em nosso país desde o início do governo Lula, tendo como ápice o triste e lamentável episódio de 8 de janeiro, o anúncio da nova equipe do MEC é um respiro de ar puro. Os nomes foram anunciados na sexta-feira, dia 6, pelo novo ministro da pasta, o ex-governador do Ceará, Camilo Santana (PT), ele mesmo uma excelente escolha do governo eleito para presidir a pasta da Educação.

Foram selecionados profissionais de educação altamente gabaritados e com vasta experiência em suas áreas de atuação. Certamente, esta equipe seria capaz de fazer um grande trabalho, desde que tivesse o foco para resolver os problemas do baixo aprendizado dos nossos alunos, se a educação fosse uma ilha. Mas, dado que a educação faz parte de um contexto maior, num país com sérios problemas sociais e econômicos, com claras indicações que devem rumar para o caminho errado, fica a dúvida sobre como esta brilhante equipe conseguirá executar um plano superambicioso para o desafio gigantesco de tirar a nossa educação do atoleiro.

Não existe plano B. O único plano para o Brasil dar certo é fazer a educação funcionar para valer Falando um pouco sobre a equipe: a dupla principal, formada pelo ministro Santana e por Izolda Cela (sem partido), como secretária-executiva do MEC, o segundo cargo mais importante da pasta, é responsável pela reviravolta na educação pública no Ceará, Estado que hoje reúne 77 das 100 melhores escolas públicas do Brasil e virou referência de sucesso no município de Sobral, em 2001. Em 2007, como secretária de Educação do Ceará, implementou o PAIC, programa de cooperação entre o Estado e municípios para a alfabetizar os alunos até o fim do 2º ano do Fundamental, que reduziu o percentual de crianças cearenses que não sabiam ler e escrever na idade certa caiu de 32%, em 2007, para atuais 0,7%.

Também do Ceará, Maurício Holanda, ex-secretário de Educação do Estado e de Sobral, assumirá a Secretaria de Articulação com os Sistemas de e Ensino (Sase), responsável por dialogar com Estados e municípios e fundamental para fomentar a articulação entre as duas instâncias que de fato entregam a educação na ponta. E Fernanda Pacobahyba, secretária de Fazenda na gestão de Santana como governador, será diretora-geral do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) na nova gestão. Além deles, foram nomeados Kátia Schweickardt, para a Secretaria de Educação Básica; Denise Carvalho, para a Secretaria de Educação Superior; Helena Sampaio, para a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior; Manuel Palácios, para o Inep; Getúlio Marques, para a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica; Zara Figueiredo, para Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão; Mercedes Bustamante, para a Coordenação da Capes; e Márcia Ângela, para a Fundação Joaquim Nabuco.

Mas de nada adianta um time dos sonhos como esse no MEC com uma equipe questionável na economia. Qualquer expectativa otimista para o fortalecimento do ensino no país sem levar em conta a atual equipe econômica e as políticas que estão sendo anunciadas, que apontam para a irresponsabilidade fiscal e a consolidação do Estado como gestor e empreendedor, são, no mínimo, uma fantasia.

Além disso, na própria área da educação, o governo petista tem prometido tudo em todos os segmentos: priorizar a educação básica, dar grande força à alfabetização e, ao mesmo tempo, reconstruir os institutos federais, instituições caras e ineficientes, principalmente por manter muitos privilégios para seus professores. E, ainda, que irá promover forte valorização da educação superior. Acredito que quando se promete muita coisa sem caber no orçamento, o final nunca é feliz. Se o novo governo quiser, de fato, fazer uma revolução na educação brasileira, terá que fazer escolhas difíceis, pois ninguém faz uma gestão eficiente fazendo somente “bondades”.

Acredito que muitos empresários e formadores de opinião do nosso país tiveram grandes expectativas em relação ao terceiro mandato do presidente Lula. A julgar por estes primeiros dias de janeiro, em todas as declarações que temos ouvido, não me parece que a versão 3.0 do nosso presidente seja a de quem aprendeu alguma coisa, pelo contrário, há fortes indicações de que ele quer repetir muita coisa que já não deu certo no passado. A julgar pela educação, é bom lembrar que os 14 anos contínuos do PT no poder não geraram uma herança bendita, mas o oposto: temos o legado de 48% das crianças brasileiras analfabetas aos 8 anos de idade e a trágica lembrança do Fies, para citar só dois exemplos.

Não existe plano B. O único plano para o Brasil dar certo é fazer a educação funcionar para valer. Já conhecemos o caminho - como eu sempre digo, não precisamos mais de diagnóstico para saber o que é preciso fazer para termos um ensino de qualidade para todos. A equipe que está à frente do MEC agora tem a vantagem de ter testado e comprovado algumas dessas soluções a nível estadual. O papel do ente federal é outro, muito mais regulador e fomentador da boa política educacional do que executor, mas é possível se valer da extensa experiência desta equipe para tirar nossas crianças do fundo do poço educacional ao qual chegamos. Mas o Brasil precisa ajudar!

O governo precisa garantir a ordem, a estabilidade e a confiança, além de trabalhar para o país crescer. É basicamente desta segunda parte que eu estou duvidando. O Brasil está por um fio. Se a confiança do mercado, dos empresários e da sociedade em geral de que a roda econômica brasileira vai girar de modo minimamente satisfatório, a corda esticada da normalidade institucional vai romper. E aí não há educação que segure, será o caos.

Ana Maria Diniz é fundadora do Instituto Península, que atua na formação de professores; empresária e conselheira do Todos pela Educação e Parceiros pela Educação

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