Universidades buscam alternativas ao Fies menos atrativo

Em: 23 Março 2018 | Fonte: Folha de Londrina

Entre as possibilidades, estão duas linhas privadas: o Educa Mais Brasil e o Pravaler

As mudanças no processo seletivo do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) a partir deste ano letivo têm impactado diretamente na forma das instituições de ensino particular captarem alunos. Com as novas regras sancionadas em dezembro pelo governo federal - que segundo entidades do setor geraram mais dificuldades tanto para estudantes como para as universidades – cabe agora às instituições de ensino buscarem diferentes alternativas de crédito educativo para atender à demanda dos estudantes.

Entre as alterações no modelo que entrou em vigor em 2018, estão a divisão do Fies em três modalidades (veja o gráfico) e um novo sistema de responsabilidade financeira para as instituições, fator que gerou um ambiente desfavorável para o programa, que agora tem juros mais altos.
Segundo a Fenep (Federação Nacional das Escolas Particulares), as mudanças no Fies podem reduzir em até 20% o número de alunos beneficiados nas instituições de ensino privado. Por outro lado, existe uma expectativa – mesmo sem um número fechado – que outras modalidades privadas ganhem força, principalmente o financiamento próprio criado por cada instituição.

O presidente da Fenep, Ademar Batista Pereira, critica as mudanças realizadas pelo Ministério da Educação (MEC). "Nas reuniões com o MEC, a gente avisou que isso aconteceria (menor capitação de alunos pelo Fies). Esse novo modelo é muito focado nos bancos e pouco social, em que o estudante precisa se endividar muito para pagar o financiamento e a escola vai acabar pagando a conta. É um modelo natimorto", ressalta.
Ele comenta que, neste começo do ano letivo, várias instituições já estenderam as estratégias para quem está em busca de crédito educativo. "As escolas estão fazendo seu papel, ampliaram o financiamento próprio, algumas saindo de mil para cinco mil alunos (neste formato). Cada instituição tem uma estratégia, porque agora tudo está mais complexo, juntamente com a crise que vivemos. Por outro lado, quem aderiu ao Fies diminuiu o número de vagas e de cursos que atendem o programa. No final, foi ruim para todos."
Por outro lado, com o financiamento próprio, Batista acredita que o cenário é facilitado porque há uma relação direta entre escola e aluno, sem terceiros envolvidos. "Assim, cada instituição cria a estratégia mais interessante . O aluno se compromete em alguns pontos e a instituição dá um desconto, sem a cobrança de juros."
Além do crédito próprio, as universidades também buscam outras alternativas, como o próprio Prouni, do MEC, e também linhas privadas como o Educa Mais Brasil e o Pravaler. "São modalidades privadas de financiamento que não envolvem o governo. De qualquer forma, está mais difícil de captar alunos com o novo Fies, que deveria estar mais simples e palatável."

Contratos caindo, novas estratégias surgindo

Números do próprio MEC apontam que o número de contratos via Fies já vinha caindo desde 2014, ano recorde de 731,3 mil contratos pelo programa. Aquele foi o último ano em que o Fies financiava 100% do valor do curso. Só para se ter uma ideia, no ano seguinte, o valor despencou para 252,4 mil contratos, uma retração de 65,4%. Agora, com as novas alterações no programa, a tendência que os valores caiam ainda mais. Momento das universidades criarem novas estratégias.
O Centro Universitário Opet, de Curitiba, tem em torno de seis mil alunos entre cursos presenciais e à distância. De acordo com o reitor Gilberto Zluhan, 20% desses alunos têm contratos via Fies. "Nós já sentimos a mudança com a criação das novas modalidades, sendo uma delas com taxa de juros mais elevada (6,5%), o número de capitações foi muito baixo, em torno de 2%. Outra situação é que o governo mudou o site do programa, o que gerou uma dificuldade para os alunos conseguirem informações claras sobre ele."
Com isso, a expectativa de Zluhan é que nos próximos anos os outros modelos para crédito educativo sejam incrementados, principalmente o interno, chamado FicOpet, realizado com recursos próprios, com concessão de até 50% na mensalidade, dependendo de cada caso. "Hoje o nosso limite para financiamento próprio é entre 3% e 5% dos alunos, enquanto o Pravaler, por exemplo, em torno de 2% a 3%. Projetamos que com essa mudança do Fies, esse tipo de financiamento possa chegar a 10% para cada modalidade. Os alunos precisam de financiamento e precisamos buscar novas alternativas, cabe a instituição criar estratégias."
Em Curitiba, o reitor da Universidade Positivo, José Pio Martins, relata que a instituição tem 25 mil alunos, entre cursos presenciais e a distância. Até o início de 2017, 28% dos alunos da instituição faziam parte do Fies. A partir desse ano, a universidade não aderiu ao programa, devido às dificuldades criadas pelo MEC, principalmente a responsabilidade de pagamento em caso de inadimplência. "A verdade é que qualquer um que tenha conhecimento de macroeconomia sabia que o programa não iria se sustentar com o tempo. O número de vagas era enorme, juros de 3,5% e financiamento 100% do montante. E agora, no novo formato, as instituições passam a responder pelas dívidas e não os bancos."
Para lidar com esse novo cenário, sem Fies, a Universidade Positivo trabalha de três formas, financiamento pelo Pravaler, pelo sistema cooperativista Sicoob e um fundo interno, da própria instituição, chamado Programa de Crédito Estudantil Positivo. "Se a mensalidade é de R$ 1.000 por mês durante quatro anos, criamos uma estratégia em que o aluno paga R$ 500 por mês durante oito anos. Além disso, vale dizer que os estudantes com menor condição financeira podem ingressar na Universidade pelo ProUni. Hoje temos 2.200 alunos que utilizam esse programa."

Estudante vê retrocesso

É bem verdade que as universidades particulares estão fazendo de tudo para criar alternativas de financiamento com as mudanças do Fies. Mas quem conseguiu se encaixar no programa governamental anteriormente, e com 100% do financiamento para pagamento pós-formação, não têm dúvida de que as novas ferramentas não atendem os estudantes com tanta eficiência.
No quarto ano do curso de medicina de uma universidade particular em Londrina, a estudante Mylena Lamonica ingressou no programa no último ano de financiamento de 100% do curso. Se precisasse pagar a universidade neste primeiro semestre de 2018, o valor seria de R$ 45.069,88, ou R$ 7.511,64 mensais. "Acho que se tivesse ingressado numa outra forma de financiamento que não fosse o Fies com 100% ficaria bem complicado me manter. Aqui na universidade vejo muitos deixando o curso porque não conseguem pagar."
Mylena cita, inclusive, que para o curso de medicina, ela ainda tem um custo em torno de R$ 1,5 mil mensais, entre transporte, alimentação, livros e equipamentos. "Eu acho que se não conseguisse o Fies neste formato, teria que ter feito mais alguns anos de cursinho e ingressar numa universidade pública, o que seria bem complicado."

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