Setor privado espera extensão do Fies e agência reguladora
Em: 24 Junho 2014 | Fonte: Valor Econômico
A aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE) deve provocar pressão maior para que o Programa de Financiamento Estudantil (Fies) seja estendido a cursos de graduação de ensino a distância. Atualmente, a política federal de acesso ao ensino superior atende apenas alunos matriculados em cursos presenciais e foi crucial para a expansão do setor nos últimos anos.
"Para atingir a meta do PNE de matricular 33% dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior, o governo provavelmente vai ampliar o Fies para o ensino a distância", diz Carlos Monteiro, consultor especializado em educação. "O Fies para ensino a distância é uma promessa real do governo. Mas isso provocará um aumento na demanda e por isso acredito que o governo vai aprovar antes o Insaes", afirma João Barroso, diretor de relações corporativas da Estácio - uma das maiores companhias de educação privada do país. O Insaes é uma espécie de agência regulatória, que deverá ter 550 funcionários e será responsável pela supervisão e avaliação dos cursos de ensino superior. Hoje, o setor é supervisionado por órgãos ligados ao Ministério da Educação (MEC).
A aprovação do PNE na Câmara dos Deputados, no começo deste mês, foi recebida com alívio pelas instituições particulares de ensino superior. Havia um temor de que os programas governamentais de incentivo ao setor, Prouni, Fies e Pronatec, ficassem de fora da nova legislação. O Fies foi o responsável pela retomada do crescimento do setor a partir de 2010 e as apostas daqui para frente giram em torno do Pronatec, programa federal que concede bolsas para alunos de cursos técnicos. "Não faria sentido deixar o setor privado fora do PNE, porque 75% dos alunos estão nas instituições privadas e o governo sozinho não conseguiria atingir as metas", opina Sólon Caldas, diretor-executivo da Associação Brasileira das Mantenedoras do Ensino Superior (Abmes).
"Como será necessário destinar um recurso alto para educação, havia risco de o governo se desinteressar ou reduzir a verba do Fies, Prouni e Pronatec, caso eles não fizessem parte do PNE", afirma o diretor de relações corporativas da Estácio. "Há mais segurança para o setor, que deixa de depender de uma plataforma de governo", acrescenta Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp, sindicato das instituições particulares de ensino superior.
A preocupação do setor em ficar sem verba para os programas não era à toa. O governo será obrigado a destinar à educação, até 2024, 10% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de R$ 485 bilhões.
No ano passado, foram fechados quase 560 mil contratos de Fies, que somaram R$ 4,4 bilhões. No acumulado dos últimos quatro anos, o montante desembolsado pelo governo foi de R$ 14,6 bilhões. A demanda tem sido tão expressiva que há grupos, como Kroton e Anima, em que 50% dos alunos dos cursos de graduação presencial estudam com o Fies. O financiamento estudantil gera grande interesse, porque tem juros anuais de apenas 3,4% e pode ser pago em até 13 anos, além de não exigir fiador.
A inclusão do setor privado no PNE não fez as companhias do setor alterarem seus investimentos, uma vez que os programas de incentivos ao setor já vinham sendo adotados há alguns anos. "O impacto é positivo, mas não dá para contabilizar o benefício, porque não se sabe quanto será destinado aos programas", afirmou Bruno Giardino, analista do Santander.
O primeiro incentivo foi criado em 2005 com o Prouni. Com ele, as instituições de ensino que concedem bolsas de estudo a alunos carentes têm isenção de impostos como contrapartida. No acumulado de 2005 a 2012, foram concedidas mais de 1 milhão de bolsas de estudo do Prouni, cujos abatimentos variam de 50% a 100% sobre o valor da mensalidade. Nesse mesmo período, a renúncia fiscal do governo com o programa foi de R$ 3,2 bilhões, de acordo com dados do MEC.
O mais recente programa do governo na área da educação é o Pronatec, que concede bolsas de 100% para alunos de cursos técnicos, independentemente da renda. A estimativa do MEC é matricular 8 milhões de alunos até o fim deste ano com investimento de R$ 14 bilhões. Segundo o Ministério da Educação, já foram registradas 7,4 milhões de matrículas entre novembro de 2011 e junho deste ano. Porém, as empresas têm analisado com cautela o programa, porque a evasão de alunos em algumas instituições chega a 40%, uma vez que não há comprometimento financeiro do estudante.
O maior ofertante de vagas do Pronatec é o Sistema S, principalmente nas escolas do Senai e do Senac. Escolas particulares têm poucas matrículas. Para 2015, o governo federal está planejando o lançamento de uma segunda fase do programa. A meta atual de 8 milhões de vagas será expandida para 12 milhões num eventual novo mandato da presidente Dilma Rousseff.
Os congressistas que aprovaram o PNE colocaram "travas" para que a expansão das vagas em escolas e universidades não ocorra apenas no setor privado, que tem mais agilidade para aumentar sua estrutura. Na educação profissional, por exemplo, 50% das novas vagas deverão ser abertas em escolas públicas. "Das 5,9 milhões de vagas que serão criadas em universidades, 40% serão em instituições públicas. Não há risco de os investimentos irem apenas para as parcerias e convênios com entidades privadas", diz o relator do projeto de lei do PNE na Câmara, deputado Ângelo Vanhoni (PT-PR).
Mas o petista confirmou que o governo continuará investindo no Prouni, Fies e Pronatec. "Não dá para pedir que os jovens esperem anos para entrar na universidade até que sejam abertas vagas públicas", afirma Vanhoni. (Colaborou Raphael Di Cunto, de Brasília)