MEC questiona poder de grevistas na Reitoria da UFRJ

Em: 31 Agosto 2015 | Fonte: O Globo

Ministério classifica como grave denúncia de grupo de professores eméritos

RIO - Na última semana de julho, funcionários e alunos da Faculdade de Medicina na UFRJ se encontraram para debater a greve que acontecia na instituição e decidiram que não queriam participar do movimento. Com isso, pediram à Reitoria para reiniciar as aulas do segundo semestre de 2015 normalmente. A Reitoria não acatou nem negou: recomendou que recorressem com o pedido de excepcionalidade ao comando de greve. A falta de decisão da Reitoria gerou indignação nos professores eméritos, que formularam uma carta no último dia 20, endereçada ao Ministério da Educação (MEC), criticando o fato de as questões acadêmicas serem resolvidas pelos grevistas, como revelado anteontem na coluna de Ancelmo Gois, no Globo. O ministério, em nota ontem, afirmou que pedirá esclarecimentos ao reitor da UFRJ sobre o “grave fato relatado”.

“Não caberia ao conselho deliberar sobre a excepcionalidade, por isso recomendamos que as unidades que tenham excepcionalidades recorressem ao comando de greve, que poderia autorizar ou não”, afirmou Eduardo Serra, pró-reitor de Graduação, durante reunião do Conselho Universitário no dia 13 deste mês, cuja gravação está disponível no site da UFRJ.

A revolta não foi somente com o direcionamento desta decisão para o conselho de greve. A carta publicada também aborda um episódio em que um professor teve negado seu pedido de afastamento do país para participar de um evento científico. “Na prática isto representa uma usurpação, aparentemente consentida, da autoridade da Reitoria, à revelia de qualquer norma ou regulamento da universidade”, afirma o manifesto.

Em nota, o Comando Local de Greve do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRJ (Sinturj) afirmou ontem que a Comissão de Ética foi criada para avaliar o que pode ou não acarretar prejuízos “irreparáveis à universidade e à população”, mas que não substitui as instâncias da universidade, apesar de não se submeterem a elas neste período: “É importante informar que, durante as greves da categoria, os trabalhadores deixam de se submeter às chefias e outras instâncias superiores da instituição para somente acatarem as deliberações da assembleia”.

Professor emérito do Programa de Engenharia Elétrica da Coppe/UFRJ, Luiz Pereira Calôba assinou a carta e critica a posição da Reitoria.

— Se você interrompe uma pesquisa, pode causar a perda de um estudo de anos. Há trabalhos, por exemplo, que dependem da manutenção e refrigeração — ilustra.


Para ele, negar o afastamento de um pesquisador para que ele possa participar de evento científico é muito prejudicial.

— Quando você submete um trabalho a um congresso no exterior, assume o compromisso de apresentá-lo. Imagina um professor que já recebeu o auxílio-viagem, pagou a passagem e não pode viajar. Como vai prestar contas? — indaga, lembrando que a ausência arranha a imagem do Brasil no exterior.

Professora emérita da Faculdade de Educação, Heloísa Buarque de Hollanda, que também assinou o documento, fez coro à reivindicação do colega.

— Acho essa carta importante porque o controle das ações da universidade deve ser da Reitoria, que é eleita para isso. A academia é algo muito sério, e essas decisões devem ser feitas no âmbito acadêmico — disse, ressaltando que isso não significa, entretanto, que ela seja contra a greve. — A greve só não pode atrapalhar o andamento acadêmico da universidade.

ALTO CUSTO PARA ALUNOS E PESQUISA

Com outra visão, José Murilo de Carvalho, membro da Academia Brasileira de Letras e professor emérito de História, afirma que a greve é prejudicial e que a Reitoria abriu espaço para o movimento:

— Sou contra a greve porque tem um alto custo para os alunos e para a pesquisa. Além de não terem uma representatividade adequada. Mas o reitor tem ligação com o setor sindical. Foi sempre militante, olha com mais simpatia. Ele encoraja a greve ou, pelo menos, facilita.

Em resposta, a Reitoria criticou a forma como os professores eméritos demonstraram seu descontentamento:

“A Reitoria registra a sua preocupação e lastima que um grupo de docentes eméritos, sem qualquer diálogo prévio, tenha exortado, por meio de carta datada de 20 de agosto de 2015, o ministro da Educação a realizar intervenção governamental na UFRJ, em desrespeito ao preceito da autonomia universitária assegurada constitucionalmente, ao recente processo eleitoral, validado por unanimidade pelos conselhos superiores da instituição, e aos colegiados superiores”.

Na nota, o reitor Roberto Leher relembra atitudes autoritárias que a UFRJ sofreu no passado, afirma que todos os trâmites para pedidos de afastamento do país estão publicados no Diário Oficial e que o órgão que define excepcionalidades no calendário acadêmico é o Conselho de Ensino de Graduação: “A UFRJ não irá afrontar o direito de greve por meios coercitivos”, informa a nota que, ao final, convida os professores eméritos para uma reunião, visando a discutir os problemas da universidade.

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