Estratégias de Mangabeira Unger para educação no país geram divergência

Em: 22 Abril 2015 | Fonte: O Globo

RIO - As declarações do Ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, a respeito dos planos para o país alcançar de fato o título de "Pátria Educadora" gerou divergência entre profissionais da área. A possível intervenção federal em municípios que apresentem maus resultados foi o ponto mais sensível entre os educadores.

Embora com ressalvas, a ideia de uma comissão de intervenção foi vista de maneira positiva pela presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais, Cleuza Repulho. De acordo com ela, é importante que o Governo Federal volte o olhar para os municípios em crise.

- É positiva (a intervenção) no sentido da preocupação com a educação, por isso, ela precisa ser feita com muito cuidado. Se ela fosse uma intervenção apenas punitiva, para cortar recursos, seria ruim, mas uma comissão organizada para ver onde está esse recurso e para ajudar os gestores e professores seria positiva. Importante que ela seja composta por pessoas das três esferas (municipal, estadual e federal)ou por observadores autônomos. As crianças não podem dar sorte ou azar de nascer em determinados lugares- afirmou.

Cleuza destacou ainda a necessidade de mais recursos para todos os municípios, discordando do ministro, ela afirma que não existem cidades ricas no que diz respeito à educação.

- Hoje não existem mais municípios ricos, com a expansão das creches, que é um modelo muito caro, estamos no limite do investimento. Precisamos ter boa gestão, boas ideias, mas também bons recursos- ressaltou.

Doutor em educação e diretor do Instituto Alfa e Beto - ONG de apoio à educação das redes municipais‑ , João Batista Oliveira critica a proposta de Mangabeira Unger de intervir nos municípios. Para ele, a postura do governo beira a arrogância ao considerar que uma ação federal resolveria o problema das escolas.

- Existe um pressuposto que o Governo Federal sabe o que é bom e sabe fazer e que o município que é ruim, então 'vamos lá e vamos resolver'. O governo não só não sabe como também não consegue. Não tem braço e perna para isso. As estratégias que funcionam são através da apresentação de propostas e incentivos para que haja pluralidade de ideias, não essa arrogância de achar que tem um ente super poderoso que pode resolver- critica Oliveira, completando que o Brasil deve levar em consideração experiências concretas de estados e municípios que reformaram suas estruturas educativas e conseguiram obter resultados.

Para a pesquisadora da USP Paula Louzano, a visão do ministro é equivocada ao pressupor que para resolver o problema basta intervir para trocar a gestão local. 

- De onde vão vir essas pessoas (para intervir)? Funcionários do MEC que vão chegar e tomar frente do processo? Não conheço nenhuma experiência no mundo onde isso funcione - disse. 

Especialista em currículo, Paula considera fundamental que o ministro analise a experiência de outros países na implementação de bases curriculares. A pesquisadora destaca que modelos não devem ser copiados, mas utilizados como ponto de partida e de reflexão para desenvolvimento de um método que se aplique à realidade brasileira. 

- Acho que o foco do debate currículo tem que ser a progressão do conhecimento. Se em matemática eu tenho como objetivo que o aluno no fim do Ensino Médio consiga calcular juros simples. Isso passa pelo conceito de proporcionalidade e fração, eu tenho que criar a progressão desses conteúdos. O grande diferencial do currículo australiano, citado pelo ministro, é a preocupação com a progressão, observar esse caso e outros é importante- explica. 

Outro ponto polêmico da entrevista de Mangabeira Unger, a escolha de diretores com base na utilização de mecanismos meritocráticos foi alvo de críticas do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio (Sepe). 

- Com a meritocracia você cria ilhas de excelência, cria rankings entre as escolas. O problema não é profissional que trabalha melhor e pior, é o investimento público na carreira, não só a nível salarial, mas na valorização do investimento público, de verbas só para escolas públicas- defendeu Alex Trentino, coordenador-geral do Sepe.

Em meio às estratégias de Mangabeira e às discussões entre os atores envolvidos na questão, a pesquisadora Paula Louzano identifica o que considera uma das principais barreiras ao desenvolvimento da educação: o fato de existirem dois ministérios com gerência sobre o tema- Assuntos Estratégicos e Educação- prejudica a implementação do programa. E questiona sobre quem, de fato, bate o martelo sobre as políticas educacionais no país.

- Agora tem dois polos que pensam a educação no mesmo governo: o MEC e a Secretaria de Assuntos Estratégicos, não fica claro quem representa a visão do governo. Quem vai colocar os planos em prática é o MEC, com os estados e municípios, mas não sabemos se o ministro da educação concorda com os planos do ministro Mangabeira.

Em nota, O MEC comentou as medidas propostas pelo ministro de Assuntos Estratégicos.

"O MEC está em constante diálogo com outros ministérios. O ministro Mangabeira Unger é um grande pensador que contribuirá muito para o projeto de educação do governo federal. O Ministério da Educação já trabalha em parceria com os estados e municípios no sentido de dar assistência às escolas e redes que tenham piores resultados no Ideb, priorizando a participação dos mesmos em programas do MEC. Todas essas ações são feitas por adesão. O MEC está discutindo com o Consed e a Undime sobre os currículos da educação básica, em particular do ensino médio. O MEC também está em diálogo com a sociedade na construção da Base Nacional Comum Curricular, para atender à Lei do PNE".

 

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