Entrevista. Renato Janine Ribeiro: ‘A sociedade é que tem de decidir sobre impostos para a educação’

Em: 09 Abril 2015 | Fonte: O Estado de São Paulo

BRASÍLIA - Para o novo ministro da Educação, professor Renato Janine Ribeiro, o Brasil vive um momento de “grande crença” no potencial do ensino. Apesar disso, ele sabe que os desafios do setor são enormes e viabilizar suas metas, que incluem expandir o financiamento da educação, não será fácil. “O aumento de verbas para a educação será uma batalha de conscientização”, diz ele. “Vamos passar um tempo mais difícil e algumas ações precisarão ser adiadas.”

Prestes a completar uma semana no cargo, ainda se debruça sobre detalhes do MEC. Nesta quarta-feira, 9, almoçou com dois ex-titulares da pasta - o prefeito Fernando Haddad (PT) e o atual diretor do BNDES, Henrique Paim - e com Luiz Cláudio Costa, que ficou interinamente no cargo neste ano e voltou para a chefia de gabinete. Na sequência, concedeu entrevista aoEstado.

O novo ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, concede entrevista exclusiva ao 'Estado', em BrasíliaO novo ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, concede entrevista exclusiva ao 'Estado', em Brasília

No debate educacional, refuta-se a ideia de que o professor seja um herói, um salvador. Em paralelo, o senhor, cuja nomeação foi bastante comemorada, teme ser visto como herói e seja essa a sua função no governo?

Fiquei muito contente com a repercussão favorável ao meu nome. Não esperava ser convidado e não esperava ter uma acolhida tão boa. Agora tenho um pouco de bom senso e não deixo a vaidade tomar conta. Uma coisa significativa é que a reação expressa a crença muito grande na educação. Há muitos anos, a gente ouve o bordão de que a solução dos problemas do País estaria na educação, mas até hoje não se teve uma visão muito clara disso. Agora parece que a sociedade quer isso para valer. Essa satisfação com a nomeação veio das potencialidades da educação e do que educadores podem fazer.

Existia uma expectativa de que o MEC fosse usado como moeda de troca política. Agora, o que mais demonstra que a sociedade quer um avanço?

Há políticos que são excelentes gestores, de educação inclusive. Temos um médico que foi um bom ministro da Fazenda, o caso do (Antônio) Palocci, e um economista que foi um bom ministro da Saúde, o (José) Serra. Depende muito de como se consegue mobilizar a sociedade. O que é bom é que a sociedade quer se mobilizar. E essa tarefa não é só do MEC. É da sociedade. Junte essa reação favorável da sociedade, da mídia, com uma disposição da presidente de priorizar tudo isso com o slogan “Pátria Educadora”. O único ponto complicado neste momento é a necessidade de fazer ajustes orçamentários.

Este será um ano perdido?

De jeito nenhum. Não vai ser tão fácil, mas todo sistema de crescimento tem uma hora que você para e ajusta. Vamos tentar aproveitar este ano para fazer o máximo disso. Precisamos diminuir custos. Também precisamos saber da dimensão do ajuste fiscal, sem isso não dá (para saber o real impacto). A gente sabe que tem de colaborar com ajustes na economia. O que nos protege é que já temos estudos para conseguir reduzir despesas que podem ser reduzidas. Vamos passar um tempo mais difícil e algumas ações precisarão ser adiadas. Embora a própria presidente tenha assegurado que os programas essenciais, como ampliação da educação infantil, serão mantidos. Já temos no Brasil uma visão sistêmica da educação, com ações de transporte e merenda concatenadas. Quando você concatena todas as ações tem a possibilidade de fazer coisas sustentáveis. E depois, temos todo um roteiro pronto, que é o Plano Nacional de Educação (PNE), que define as prioridades.

Setores da sociedade estão preparados para que o dinheiro saia de algum lugar e vá para educação para se atender os 10% do PIB no setor e financiar as ações do PNE?

Isso vai ser uma batalha longa de conscientização. Vamos ter de conscientizar as pessoas de que o dinheiro da educação é um dos melhores gastos existentes. Há no País um descontentamento grande com a carga tributária. Isso está engessando os gestores, tanto na União quanto nos Estados e nos municípios.

Aumentar imposto para educação é opção?

A sociedade é que tem de escolher o que quer. Se ela quer bons professores, tem de escolher. Hoje tem a convicção de muita gente de que o dinheiro público é mal gerido. Então o que podemos fazer é ter absoluta transparência, mostrando o êxito de ações. A gente vai oferecer cada vez mais é essa relação custo-benefício. A sociedade tem de perceber quando o uso do dinheiro na educação é bom para perceber o que ela quer fazer do dinheiro. Mas a este ministério não cabe fazer essa proposta (de aumentar impostos).

A educação básica será a prioridade desse governo?

É a prioridade porque é o que vai durar mais tempo. Quando você forma uma criança hoje, de 3 anos, ela vai chegar até 2100, então é algo muito importante. Mas eu insisto em um ponto: essas questões são éticas, não são de puro interesse. Temos um dever com os cidadãos vulneráveis, fragilizados, que não tiveram a educação de qualidade que nós tivemos e as vantagens competitivas de que desfrutamos. Temos um dever em relação a eles. 

O lema “Pátria Educadora” não é arriscado do ponto de vista de efetivação?

O lema é uma ênfase, não é promessa de entrega de serviços. Ênfase que espera, sim, que em quatro anos haja um avanço na educação. Mas a educação é vagarosa para reagir. Mexer com a cabeça das pessoas é lento. 

No momento, professores da rede estadual de São Paulo estão em greve e docentes federais já iniciam campanha salarial. Será possível conversar sobre valorização docente neste ano?

Será necessário conversar. Conversar sempre. A qualidade dos professores depende de muitas coisas, mas precisa ter valorização salarial. Isso está muito colocado na meta 17 do PNE. Porque o PNE é quase a Constituição da educação, é a Constituição do nosso futuro. A meta 17 diz que devemos ter até 2020 os salários dos professores da rede básica equiparados a pessoas da mesma escolaridade. É um salto de quase 40%, não é pequeno. Pedimos grandes esforços para os entes federativos. Mas é absolutamente necessário fazer isso. Não se pode desvalorizar quem escolhe a docência. Tem de ter mais dinheiro e mais qualificação, valorizar o professor na sala de aula. E isso tem de ser medido e valorizado pelo seu desempenho educando seus alunos. Precisamos reconhecer o bom professor.

Como medir bom desempenho do professor?

A métrica mais simples é pelo desempenho dos alunos, do que eles aprenderam. Não é perfeita, mas é a mais simples. Pode-se desenvolver métricas mais sofisticadas, mas o importante não é o resultado, mas o espírito da coisa. Tem de deixar claro que lecionar e formar gente é relevante.

Acredita em bonificação?

É bom ter valorização salarial quando o professor é bom. Mas é claro que tem de ter também uma valorização ética, uma satisfação. O professor tem de voltar a ser referência na sua cidade. 

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