Conselho Nacional de Educação aprova formação de professor de 4 anos e foco na prática

Em: 13 Novembro 2019 | Fonte: Folha de S.Paulo

Metade da carga dos cursos deverá ser conectado à Base Nacional Comum Curricular, disposição criticada por especialistas

O CNE (Conselho Nacional de Educação) aprovou nesta quinta-feira (7) novas diretrizes para a formação de professores que ampliam a duração dos cursos e estabelecem maior foco em atividades práticas.

Parte dos cursos deverá ser conectada à Base Nacional Comum Curricular, documento que prevê o que os alunos da educação básica devem aprender. Essa disposição, no entanto, é criticada por especialistas, assim como a ausência de um olhar mais cuidadoso para os cursos a distância.

O documento também estipula um conjunto de competências que se espera de um professor formado, nos âmbitos dos conhecimentos, práticas e engajamento profissionais.

A resolução aprovada pelo CNE segue para homologação do ministro da Educação, Abraham Weintraub. Os secretários de MEC, Janio Macedo (Educação Básica) e Arnaldo Lima (Educação Superior), fazem parte do CNE e votaram a favor das mudanças.

Ficou decido que as graduações de licenciaturas e pedagogia deverão ter duração de quatro anos, e não mais de três anos. A previsão de carga horária maior já constava em resolução de 2015 do CNE, mas sua vigência tem sido adiada desde então.

Instituições privadas de ensino superior, que concentram a maioria das matrículas nesses cursos, sempre foram contrárias à ampliação do tempo do curso e houve pressão para que isso não avançasse. Um dos argumentos é de que a evasão dos cursos é alta e cursos de maior duração podem reduzir o número de formados.

Cursos de direito, por exemplo, têm duração mínima de cinco anos. Os de medicina, seis anos.

Agora, as formações de professores precisam ter ao menos 3.200 horas, divididas em quatro anos. Metade da carga horária será voltada para conteúdos específicos das áreas e componentes previsto na Base Nacional Comum Curricular.

O período equivalente a um ano (800 horas) será comum a todos os cursos de formação de professores, com conceitos educacionais e pedagógicos. As outras 800 horas terão foco na prática pedagógica.

Esse bloco prático é dividido, segundo o texto aprovado, em duas partes: metade será para um estágio em escolas e o restante, direcionado a práticas nos componentes tanto da parte comum quanto do bloco relacionado aos conteúdos da Base Nacional.

Essa carga horária prática presencial também deverá ser atendida por cursos de EAD (educação a distância), de acordo com o texto aprovado. Atualmente, mais da metade das matrículas dessas graduações estão nessa modalidade.

A má qualidade dos cursos de formação dos professores é apontada por especialistas como um dos principais gargalos educacionais. Estudos já apontaram que as graduações são excessivamente teóricas e descoladas da realidade da sala de aula —os estágios obrigatórios no formato atual também são considerados pouco efetivos.

Agora, essa parte prática deve ser supervisionada por docente da faculdade e também por um professor experiente da escola onde ocorrerá essa formação. Essas atividades devem ser desenvolvidas desde o início da graduação.

A licenciatura (nas diversas áreas, como língua portuguesa, história, física e química) é exigida para professores do ensino fundamental (5º ao 9º ano) e do ensino médio. Para a educação infantil e anos iniciais do fundamental (1º ao 5º ano) a formação indicada é a pedagogia.

O conselheiro Mozart Ramos, que relatou a proposta no conselho, diz que a ampliação da carga é essencial para garantir melhores professores, apesar de críticas sobre as dificuldades de estabelecer as mudanças.

"A gente não tem que pensar no hoje. O hoje é o passado do futuro. A gente tem que preparar e olhar para onde aponta o farol, aprendendo com as experiências do passado", disse.

O diretor-executivo da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior), Sólon Caldas, diz que, antes de quaisquer mudanças, é preciso uma politica pública de incentivo para que os jovens desejem a profissão de professor. "Não necessariamente o aumento de carga horária de formação se traduz em qualidade. É preciso modernizar as licenciaturas e introduzir novas tecnologias", diz.

Esse texto começou a ser discutido em setembro no CNE. Mesmo com a realização de audiências públicas e recebimento de sugestões, o tema teve trâmite acelerado no conselho.

Luiz Dourado, professor emérito da UFG (Universidade Federal de Goiás), diz que o conselho ignorou dezenas de sugestões encaminhadas por entidades de educação. A principal crítica é sobre o foco demasiado na Base Nacional Comum Curricular, que ele classifica como submissão.

"A nova resolução subordina a formação de professores à base nacional", diz ele, que também faz parte da Anped (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação). "A formação assume um caráter restrito e instrumental do docente, a enfase na prática fica dissociada da teoria. Isso vai acarretar um processo formativo prescritivo".

Dourado, que foi relator da resolução de 2015 que agora será revogada definitivamente, também repercute uma crítica presente durante as discussões, relacionadas ao EAD. "O texto poderia trazer discussão acurada de formação a distância, com relação a padrões de qualidade, isso aparece de maneira secundarizada e vai permitir adoção irrestrita da modalidade".

Além de prever que a parte prática seja presencial mesmo nos cursos a distância, foi incluído na versão final um artigo que exige que cada disciplina oferecida no EAD tenha fundamentação técnica pautada por pesquisas que demonstrem viabilidade para serem desenvolvidas na modalidade.

Para o presidente do CNE, Luiz Roberto Liza Curi, o foco da nova resolução são as competências esperadas no processo de formação. "As competências podem ser atendidas na interação relevante entre práticas e atividades mais teóricas", disse.

O documento define as diretrizes gerais e também institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica. Trata-se de um conjunto de competências gerais e específicas que devem nortear os currículos dos cursos.

Entre as competências específicas estão, por exemplo, o conhecimento da estrutura e a governança dos sistemas educacionais, o planejamento de ações de ensino que resultem em efetivas aprendizagens, e o engajamento no projeto pedagógico da escola. As faculdades devem, portanto, garantir o atendimento dessas competências no plano de seus cursos.

A nova diretriz ainda prevê que as instituições de ensino superior constituam um órgão (que pode ser um instituto ou centro de referência) que articule todas as formações de professores, hoje organizadas de modo fragmentada (cada área forma do seu jeito). Essa instância deve ainda garantir a integração entre docentes da universidade e das redes de ensino, "promovendo uma ponte orgânica entre a educação superior e a educação básica".

As instituições deverão ainda organizar um processo de avaliação dos egressos de forma continuada. O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) deverá elaborar instrumento de avaliação in loco dos cursos e reformular o Enade, a avaliação federal com concluintes.

Também são descritas as regras para cursos de complementação pedagógica (de formação em uma segunda licenciatura). Se a complementação for em área diversa da formação original, o curso deverá ter 560 horas.

As instituições de ensino têm dois anos para se adequarem às novas regras.

 

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